
O pesquisador do Ipea Sandro Carvalho explica que já era perceptível uma tendência de crescimento da fragilização das relações de trabalho mesmo antes do surgimento dos aplicativos de celular. Existem muitos empregados informais, por exemplo, em setores não ligados a plataformas tecnológicas, como os segmentos da construção e de hospedagem e alimentação.
“A fragilização é uma tendência observada, com graus distintos, desde os anos 90. A fragilização do trabalho consiste na oficialização de formas de subemprego, tornando as formas precárias de trabalho cada vez mais legais. Ou seja, transformar essas formas de trabalho em algo não ilegal”, explica Carvalho.
Pejotização
Nem todos os autônomos são informais. Muitos possuem CNPJ, embora representem uma parcela bem menor dentro do universo daqueles que trabalham por conta própria.
Conforme o IBGE, 6,8 milhões exercem atividade no país como pessoa jurídica (PJ). É o caso de muitos profissionais liberais que possuem seus próprios escritórios ou consultórios, por exemplo.
”Profissionais altamente qualificados como médicos, advogados e até alguns jornalistas talvez prefiram ser PJ, pois assim pagam menos imposto e conseguem, de maneira particular, acessar os benefícios vinculados a um trabalho formal. Eles podem contratar uma previdência privada, contratar um seguro de saúde particular etc.”, afirma Carvalho.
O problema, segundo o pesquisador, surge quando a “pejotização”, ou seja, a contratação de um empregado como PJ em vez de registrá-lo formalmente, é utilizada pela empresa para reduzir custos trabalhistas. Geralmente, isso ocorre com trabalhadores “não tão qualificados”, destaca Carvalho.
“Grande parte dessa ‘pejotização’ resulta na perda de direitos associados à carteira de trabalho. Assim, aumenta-se significativamente a insegurança do trabalhador no emprego. A pessoa pode ser dispensada de modo mais simples, sem direito a indenizações, sem acesso ao seguro-desemprego. E fica mais complicado definir quem é responsável em situações de risco de acidente, porque você está lidando com uma contratação de serviço. E isto não é compensado por um salário mais alto”, frisa o pesquisador do Ipea.
Ele ressalta que a reforma trabalhista de 2017 facilitou a “pejotização”, ao permitir que trabalhadores autônomos tenham apenas um contratante, no caso o seu empregador.
“Torna-se complicado distinguir ou tentar determinar precisamente se um trabalhador autônomo realmente tem vínculo empregatício com determinada empresa, se você permite, por exemplo, que os trabalhadores autônomos tenham apenas uma pessoa contratadora de seus serviços.”
Em entrevista à Agência Brasil em abril deste ano, a vice-coordenadora nacional da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho do Ministério Público do Trabalho (MPT), Priscila Dibi Schvarcz, afirmou que a “pejotização” configura uma fraude em relação ao emprego.
“[A prejotização] envolve a contratação de um trabalhador subordinado por meio de pessoa jurídica, com o intuito de ocultar o vínculo empregatício por meio da formalização contratual autônoma. Dessa forma, trata-se de um mecanismo criado para dissimular o vínculo empregatício por meio da formalização contratual autônoma”, afirma a procuradora.
A questão da “pejotização” está sendo analisada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em abril, o ministro do STF Gilmar Mendes decidiu suspender todos os processos relacionados a essa temática que estejam em tramitação na Justiça, até que a Suprema Corte se pronuncie sobre o assunto.
Reivindicações
A Pauta da Classe Trabalhadora 2025, entregue recentemente ao presidente Lula, apresenta outras 24 reivindicações, além das já mencionadas regulamentação dos trabalhos intermediados por aplicativos e o combate à informalidade. Entre elas estão a recuperação do poder aquisitivo de aposentados e pensionistas, valorização do salário mínimo, fortalecimento do FAT e do FGTS, redução da jornada de trabalho sem redução salarial e fim da escala 6×1.
Em sua conta no Instagram, o presidente Lula registrou o recebimento da pauta. “Nosso governo tem raízes nessa batalha e estará sempre disponível para o diálogo com aqueles que movimentam a economia”, declarou o presidente.
Apesar de o número de trabalhadores autônomos informais e aqueles sem registro na iniciativa privada representarem quase um terço da população empregada no país, o IBGE tem observado crescimento no total de empregos com carteira assinada na iniciativa privada.
Dados recentes mostram que o número total de trabalhadores com carteira assinada está em um nível recorde. No primeiro trimestre deste ano, havia 39,4 milhões de empregados nessa condição, o maior volume para um trimestre desde 2012, quando a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) começou a ser conduzida pelo IBGE.
Fonte: Agência Brasil